“Sofri falta de amor na infância. Serei ciumenta?”
Provavelmente, sim.
Você sabia que o ciúme pode ser uma consequência direta do abandono afetivo sofrido na infância?
Pois é. E essa negligência repercute em vários aspectos sentimentais na vida de um adulto. Não só do adulto, do adolescente também.
O adolescente pode manifestar essa falta de amor em diversos momentos, como: na dificuldade de se relacionar com os amigos, ou seja, criar vínculos; na vida escolar, geralmente com notas baixas, comprometendo o aprendizado; na hora de conquistar seu par, etc.
Enfim, o prejuízo ao desenvolvimento é enorme.
Primeiramente, você precisa saber que sentir carência é normal. Sentir carência em excesso é que é patológico.
Todos somos carentes em um certo grau e isso não representa problema algum, afinal, somos seres que vivemos em comunidade, em sociedade, e, como tal, dependemos dos outros, da atenção e do olhar dos outros.
Desde que isso não se torne doentio.
Quando a carência chega a um ponto de se tornar doentio devemos investigar a causa desse excesso, dessa cobrança em demasia, que leva, inevitavelmente, ao ciúme.
E o ciúme do parceiro é um sentimento bem marcante na vida de um adulto que sofreu falta de demonstração de amor e cuidados dos pais.
O ciúme é uma manifestação de vários fatores ocorridos em sua vida. E são vários mesmo. Você só tem que descobrir qual foi o seu.
Você simplesmente não dorme confiante, tranquila e acorda ciumenta. Esse sentimento já te acompanha desde muito tempo e com certeza já se manifestou em outros momentos.
E uma das causas mais comuns para você se tornar ciumenta é a negligência afetiva na infância.
Isso mesmo. E esse “abandono”, essa “negligência”, repercute por toda a sua vida e, com ele, vem todo tipo de sentimento negativo.
Você, provavelmente, não teve os cuidados básicos que uma criança necessita satisfeitos.
E que cuidados são esses?
Os cuidados básicos que todos temos direito desde o momento em que nascemos.
O nascimento já é uma dor.
Você está confortavelmente no útero, tendo tudo que precisa, e, de repente, nasce. Já há aquela dor do nascimento, da separação, aquele rompimento brusco.
E tudo o que você precisa naquele momento e no decorrer da infância são os cuidados necessários básicos satisfeitos, dentre eles o amor, carinho, afeto e atenção.
O toque, o beijo, o abraço e uma frase tão simples de ser dita como “eu te amo”, fazem muita diferença no desenvolvimento emocional recebidos pela criança na primeira infância.
Muitos pais, por não terem passado pela experiência de receber amor, afeto, carinho, proteção; por sua vida atribulada; por motivo de doença; ou por outro motivo qualquer, não transmitem aos filhos tudo o que uma criança necessita para se transformar em uma pessoa com autoestima elevada e confiante.
Na sua infância seus pais lhe deram carinho na medida certa? Deram atenção suficiente? Ajudaram em suas dificuldades? Apoiaram suas decisões?
Se a resposta foi “não”, saiba que você é uma forte candidata a ter ciúme patológico, que vem acompanhado de baixa autoestima, sentimento de inferioridade, falta de confiança em si própria, insegurança e outros sentimentos desagradáveis. A lista é grande…
A privação de amor e cuidados pode até causar, na vida adulta, ansiedade, síndrome do pânico e depressão.
E quando os pais se separam e não podem estar presentes? Ou mesmo no caso de falecimento?
Muito boa essa pergunta. Acontece demais de os filhos se sentirem abandonados e rejeitados.
Inclusive acompanhados de sentimento de culpa. Quando não se culpam, transferem essa culpa ao pai presente.
Um exemplo que representa bem essa situação é de um menino cujo pai, seu ídolo, foi embora quando ele tinha quatro anos.
Foi muito sofrimento, acompanhado de decepção, frustração e medo. Só para citar algumas das consequências que essa criança sofreu.
Na idade adulta tornou-se uma pessoa agressiva e, inclusive, misógina, por culpar a mãe de não ter “segurado” o pai.
Então ele transferiu a raiva que sentia da mãe a todas as mulheres. Ao mesmo tempo em que era extremamente ciumento.
Foram alguns anos de tratamento psicanalítico para ele superar essa dor e se libertar desse sentimento de angústia.
No caso de falecimento, mesmo a criança tendo ciência que a culpa não foi do ente querido que não está mais presente , ela sente um abandono profundo.
A família terá que tentar suprir essa falta que o ente querido deixou, para que a criança não se sinta abandonada e não traga problemas mais graves à sua formação psíquica.
Questão igualmente complexa e que, em muitos casos, demanda um acompanhamento profissional.
Criança abandonada, adulta enciumada.
Se você se sentiu abandonada ou rejeitada por seus cuidadores, se lhe faltou amor, carinho, cuidados, atenção, compreensão, saiba que seu medo de passar por tudo isso novamente é muito grande.
Você tem um medo extremo de sentir solidão; uma necessidade quase enlouquecedora de que alguém cuide de você.
A angústia é vivida de forma intensa, pelo medo de perder o sujeito amado e que lhe dá a atenção que você necessita tanto.
O medo de passar novamente pela dor do abandono é enorme. Esse medo pode até nem estar consciente para você. Você só sabe que tem, mas não sabe o motivo.
De uma forma ou de outra você quer que seu parceiro supra essa necessidade afetiva não satisfeita.
E o pior, por mais que você receba esse amor subtraído, ele nunca é suficiente, porque essa ferida aberta é difícil cicatrizar.
Geralmente, o parceiro, por mais que tente, consciente ou inconscientemente, não preencherá esse vazio.
É então que surge o ciúme doentio.
Porque você vai cobrar do seu parceiro infinitas manifestações de amor. Compulsivamente. Exigir dedicação total. Vai controlar seus passos, sua vida, sua rotina, para se certificar de que você não passará por tudo novamente.
Há pessoas que além do ciúme exagerado apresentam forte tendência a agressividade.
Quando não é a agressividade, é seu oposto, a vitimização. A síndrome do coitadinho. De uma forma ou outra o abandono se manifesta.
E qual a consequência para meu relacionamento
Muita angústia e muita cobrança. O medo do rompimento é muito marcado.
O medo de perder seu amado é muito grande, porque você é atormentada por sentimentos de frustração desde muito tempo. Aí a ameaça de uma nova frustração causa imensa dor.
A busca por atenção é muito grande, e por mais que receba amor de seu parceiro nunca é suficiente.
Exigências de amor infindáveis, apelo emocional, carência desmedida, reivindicações de atenção, tudo isso tornará você uma tirana, sufocando qualquer um que se aproxime.
E você vive assim: com medo de perder, do abandono, da rejeição, etc.
Entenda uma coisa: quando você fala que se sente abandonada não é a adulta falando, é a criança. Você só está revivendo a mesma sensação que viveu antes, na infância.
Você está projetando uma carência afetiva de sua mãe (ou de quem a represente) em seu parceiro.
E seu parceiro sofre porque, por mais que a ame, é muito cansativo conviver com uma pessoa com uma autoestima tão regredida a ponto de provocar todas as consequências que um ciúme patológico causa.
Tanto na vida social, profissional, familiar e amorosa.
Livrando-se do ciúme
Raiva, depressão, síndrome do pânico, ansiedade, problemas gástricos e dores de cabeça constantes são só alguns dos sintomas psicossomáticos que você pode apresentar por ter sofrido abandono. Por ter sentido carência de amor materno na infância.
Você não se valoriza, acha constantemente que está entediando seu parceiro, sendo cansativa, chata, sente-se feia, desmerecedora dele, além de seu ciúme excessivo.
Isso tudo resume-se em um enorme sentimento de exclusão. Aquela antiga exclusão…
E tratar das causas desses sintomas que te acompanham desde a infância não é assim tão fácil.
Falta de amor, falta de carinho, cobranças, frustrações, decepções, tudo isso você sente agora como se pertencesse ao presente. Mas não é bem assim. Isso já vem de longa data.
Pode ser até que você não tenha consciência de que tudo que está acontecendo em seu relacionamento deve-se a fatores vividos anteriormente.
E até você descobrir, já perdeu vários pretendentes de qualidade.
No entanto, você, a partir de agora, já tem ciência de que está projetando um sentimento de angústia relacionado à sua infância em seu parceiro.
Seja resiliente, aprenda com a experiência passada e cresça emocionalmente. Seja capaz de enfrentar suas dificuldades agora que sabe de onde elas vem.
Livre-se da sensação de abandono e rejeição.
Trabalhar esses conteúdos requerem paciência e perseverança de sua parte, porque mexe em feridas profundas e dolorosas.
Se tudo isso for muito difícil para você e, quem sabe, você já esteja tão ferida com os acontecimentos que se torna quase impossível ter força para superar os traumas advindos do passado, não hesite, procure ajuda profissional.
Um psicanalista é o profissional mais indicado nesse caso, porque ele vai te escutar, vai procurar com você tudo o que você passou e tudo o que está repetindo. E vai te ajudar a dar uma nova “roupagem” a esse sentimento.
Com certeza você sairá fortalecida e não deixará mais os sentimentos de inferioridade, baixa autoestima e ciúme patológico te dominarem.
No livro Ciúme Patológico, Passando dos Limites, você encontra, além da Síndrome do Abandono como causa provável de seu ciúme patológico, outros motivos igualmente importantes com os quais você poderá se identificar.
Uma frase para reflexão: “Agora que você sabe qual o gatilho emocional que traz seus pensamentos negativos, trate-o. E não responsabilize mais os outros pela sua infelicidade.”
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Parabéns pelo seu trabalho. Gostei muito de como abordou o tema CIÚME. Bastante esclarecedor, com uma linguagem de fácil compreensão. Obrigada por compartilhar seus conhecimentos!
Obrigada, Liana. Sigo na luta, a cada semana um artigo novo. E espero que, com isso, consiga chegar a quem realmente precisa.
Parabéns Dra Giorgia, gostei muito dos seus artigos. A linguagem fácil e simples ajuda os leitores a compreenderem melhor todos os traumas que carregamos desde a infância.
Obrigada, Emiliano Duarte. Minha intenção é ajudar a todos a entenderem, principalmente, as causas do ciúme. Para que ele deixe de ser um problema em suas vidas.
consegui entender a dinâmica do ciúme. Vai ser uma ferramenta importante para eu usar em atendimento clínico
Que bom que o artigo pôde ajudar você de alguma forma. Estou às ordens.