Adolescência Descomplicada

Autora

Giorgia Matos

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“Sou adolescente, entenda-me!”

Fase complicada ou fase mal compreendida?

Resposta certa: as duas coisas.

No momento em que a pessoa não é nem criança nem adulta e passa por um turbilhão de sentimentos novos, alterações físicas e hormonais, os pais, ou cuidadores, se desesperam por não saberem como lidar com essa questão.

Estão os dois perdidos. Pais e adolescentes diante dessa trama com final inesperado. Mas, calma! Não é motivo para desespero.

Sabendo o que está acontecendo e como passar da melhor forma por essa etapa da vida, a trama terá um final feliz.

Sou assim, pai. Normal

Jovem menina irritada

Na adolescência a maioria dos comportamentos são considerados normais. Estranho seria se o adolescente mantivesse um comportamento estável e equilibrado.

É uma fase de transição e, por isso mesmo, bastante conturbada. Mas, sim: são consideradas normais e esperadas, apesar de serem atitudes que diferem das encontradas nas crianças e nos adultos.

Digo sempre aos meus amigos professores: “se você vir um aluno adolescente calado, no canto, sem manifestar nenhuma emoção, aquele que não dá trabalho, não atrapalha a aula em nenhum momento, que você considera o aluno perfeito, ali está seu aluno problemático. Ali está um provável suicida”.

Que esta frase não alarme, mas que também não seja ignorada.

Vivemos constantemente com o impacto da notícia que um adolescente se suicidou. Não podemos fechar os olhos para esta realidade. Seria irresponsável.

A identidade do adolescente se dá exatamente nesse período em que ele já obteve toda a educação, cultura e preceitos morais na infância e agora prepara-se para moldar sua estrutura psíquica adulta.

O que se passa em meu corpo?

Garota observando as transformações em seu corpo

O que dizer da mudança que o adolescente observa, atônito, perplexo em seu corpo? Alterações físicas que ele não tem o mínimo controle.

Alguns nem mesmo aceitam essa mudança que está ocorrendo em seu corpo, antes liso, sem pêlos e sem protuberâncias. Alguns se sentem agredidos diante de tanta transformação, principalmente se ele não for educado para essa novidade.

Se seus cuidadores não o prepararam, de uma forma satisfatória, para essas mudanças bruscas que agora ele vê em seu corpo, podem gerar, aí, conflitos internos.

E geralmente os adultos nem se dão conta de onde veio esse conflito. A orientação adequada leva o adolescente a crescer maduro e sem traumas.

Responsável, eu?

Menina assustada, com medo das responsabilidades pois não é mais criança

Não só essas mudanças físicas assustam o adolescente. A responsabilidade agora exigida dele causa uma tremenda confusão. Ele não a tinha na infância e agora foi imposta de forma inesperada e, às vezes, de forma brutal.

Toda a responsabilidade que a adultez comporta leva o adolescente a um medo. O medo do novo, do desconhecido. Medo de errar, de não ser capaz, de não “dar conta” do que está sendo imposto pelos pais, pela sociedade, e, principalmente, por ele mesmo.

E essa novidade traz insegurança. Em um momento ele era dependente exclusivamente dos pais, que resolviam tudo por ele, que pensavam por ele, e, de repente, o adolescente tem que pensar e resolver as questões por si mesmo, com a imposição sutil que a vida adulta traz.

Tudo isso mexe no inconsciente do adolescente. Ele sabe dessas mudanças mas não sabe que o que está causando essa vontade de ter certos comportamentos, por vezes, inadequados, são elas.

Quero falar, só isso

Menino impossibilitado de falar o que sente

Muitos adolescentes têm dificuldade em falar, em colocar seus sentimentos e aspirações em verbo, e, por isso, atuam. Transformam palavras em atos e os seus cuidadores tem que ter uma aguçada percepção para captar essa mensagem quase subliminar que este filho adolescente está tentando transmitir. Nem sempre isso é fácil, principalmente nesse mundo agitado e cheio de atividades em que se vive. Não há tempo.

São poucas as horas em que os pais ou responsáveis passam na presença dos filhos, perdendo além de momentos importantes, a capacidade de sentir uma situação, a sutileza dos gestos e palavras que eles possam estar transmitindo.

E eles transmitem. São “gritos mudos”, um pedido de atenção constante, mais ainda do que na infância.

Muita coisa nova em um momento só da vida. E ele está perdido. Às vezes quer falar e não tem com quem, às vezes quer agir, às vezes tem com quem falar mas não confia porque supõe que ninguém vai entendê-lo.

Na cabeça do adolescente, só ele está passando por esse turbilhão de sentimentos e, se ele falar, vai se expor. Talvez digam que ele não é normal. Melhor ficar quieto!

E é justamente nesse período, em que ele precisa muito dos pais, que estes deixam os filhos mais à vontade, deixam de “cuidar” deles. Imaginam que ele já cresceu, já tem discernimento e podem “se virar” sozinhos. Ledo engano!

Por isso que, nessa fase da vida o adolescente se sente abandonado, causando nele uma certa infelicidade e toda sorte de sentimentos de descaso, como se ele não fosse importante para aquela família.

Alguns casos mais graves evoluem para uma depressão.

Minha Turma

Adolescentes vivendo uma transformação, e se divertindo juntos

O adolescente se vê inserido em uma sociedade. Ele se dá conta, nesse momento em que está mais aberto às questões sociais, que “algumas coisas não se encaixam” na sociedade e na política.

Por isso, ele se insurge contra esses “poderes” que são impostos e não aceita, não vê coerência. É nesse momento em que se insere em grupos de reformas sociais e políticas. De acordo com sua formação educacional e suas ideologias, ele se liga a turmas com os mesmos interesses, e fantasiam, e põem em prática desejos de mudanças.

É um mundo de sentimentos novos, inclusive o de justiça. Tudo isso muito forte e latente. O adolescente não se conforma e tem necessidade de mostrar sua opinião e agir.

Esse é só um dos fatores que aquele adulto em formação se depara. É tudo novo, é tudo em grande quantidade, é tudo ao mesmo tempo. Junto com isso, os hormônios, a mudança corporal, a mudança de comportamento dos pais, a maior exigência de obrigações, exigências de atitudes, enfim…

Essa transformação é única e vivida somente nessa fase da vida.

Alguns pais ignoram essa fase do adolescente, tratando-a como uma fase qualquer. Esse erro é comum e, por vezes, perigoso.

Junto com a sua turma, o adolescente passa por uma fase que acha que não precisa de nada que venha dos pais, e que ele, por si só, se basta. É uma fase com tendências narcísicas bem marcadas. E, geralmente, é a fase que eles passam mais afastados dos pais.

Além do mais, ao mesmo tempo em que os pais não podem desvalorizar de forma alguma as ideias, conquistas, criações e ideologias dos filhos, pois isso causaria uma ferida quase irremovível, trazendo sentimento de rejeição e incapacidade, os pais não podem deixar “correr solto”.

Tanto essa “turminha” pode trazer consequências boas como ruins. É nesse momento em que as drogas são apresentadas, se o adolescente não fizer uma boa escolha das companhias.

Ficar atento, sim. Exigir que ele conte todos os seus passos é doentio. É preciso estabelecer bases fortes de confiança para que os pais não adoeçam mental e fisicamente, e os filhos se sintam livres para agir de acordo com sua orientação, de forma responsável.

Não se pode tratar o filho como uma criança. É humilhante e depreciador. Ele se tornaria uma pessoa com baixa autoestima, sentimento de inferioridade, sem confiança em si mesma, insegura e ciumenta. E esses sentimentos são precursores da ansiedade, síndrome do pânico e depressão.

Ao mesmo tempo não se pode tratá-lo como adulto, pois ele ainda não tem maturidade para isso. Em tudo, tem que haver equilíbrio. Fazer exigências, sim, mas na medida certa.

Pai, me ajuda

Garotinha chorando longe dos pais

Primeiramente o adolescente tem que entender que não é mais criança, mas que também ainda não é adulto. Que tudo isso leva tempo. Mudança no corpo, mudança hormonal, mudança social… tudo isso leva tempo.

Ele tem que ter responsabilidade através da independência, mas também precisa saber que ainda é dependente dos pais em certa medida. Que não está desamparado nem sozinho.

Que esse vazio que sente é normal e que todos passam pelo mesmo sentimento.

A busca da identidade é normal porque a identidade infantil está simultaneamente sendo banida, deixada de lado e não há nada a temer. Essas mudanças vão se transformar e desenrolar aos poucos.

O adolescente é, geralmente, mal compreendido pelo adulto. Como ele não aceita certas atitudes e comportamentos impostos pelo adulto, reage com agressão. E os pais, em resposta, intensificam a violência do adolescente, reagindo com imposição e reforço de autoridade.

Há pais que prendem o adolescente em casa, ou tiram o tablet, ou cortam a mesada. Isso é uma violência e pode, inclusive, causar o efeito rebote: revolta e desejo de vingança.

Excesso de autoridade não é uma saída. Apenas mostra que os pais perderam o controle. É um comportamento cansativo e desgastante e tem que ser evitado.

E não pode haver ressentimento, ao final, senão serão dois com dificuldades. O que poderia ajudar se iguala em confusões e discussões e nada se resolve. A conversa, mesmo que não seja tão pacífica, tem que ter um destino, uma solução, e trazer paz.

Tudo tem que ser resolvido com um diálogo aberto, sem provocar temor, sem ameaças. Respeitando, compreendendo e oferecendo ajuda no que for necessário. Mostrar as mudanças que estão ocorrendo com ele e fazendo ele compreender que os pais já passaram por isso também.

Conflitos Internos dos Pais

Jovem rapaz ignorando seus pais agressivos

A realidade adulta chega para o adolescente de forma impactante. E o pior é que, às vezes, os pais têm conflitos interiores mal resolvidos e não sabem dar o suporte necessário para que o filho sobreviva sem traumas a esse turbilhão de sentimentos pelos quais está passando.

Ora, se eles mesmos não se acham maduros, se não resolveram suas questões mentais internas, terão poucas chances de transmitir algo saudável.

Resolver seus problemas inconscientes, antes de tentar compreender o filho, é uma boa medida a ser tomada. Não há como resolver as questões dele se as suas próprias estão pendentes.

Um exemplo que retrata bem essa realidade é o da mãe cujo grande sonho era ter um curso superior, o qual ela não pôde concretizar. Essa mãe despeja o seu sonho no filho adolescente, cobrando excessivamente esse feito, falando disso o tempo todo e exigindo as melhores notas da escola, inclusive já escolhendo pelo próprio filho seu curso superior.

Além de imaturo é castrador. O filho se vê impelido a realizar o sonho da mãe enquanto deixa de lado seus próprios sonhos.

O resultado de tudo isso provavelmente será uma revolta futura e o filho (não mais adolescente depois da formatura), entregará o diploma à mãe e procurará seguir seu caminho.

E, se fôssemos continuar nesse exemplo, teríamos que escrever um livro inteiro sobre o assunto, pois esse problema ainda prosseguirá por gerações. O filho, obediente à mãe, faz um curso que não era sua vontade, forma-se e entrega o diploma à mãe.

Em seguida, conclui outro curso, ainda revoltado por sua mãe tê-lo feito perder tempo e, como resultado da imposição materna, se revolta contra todas as mulheres, achando que todas querem “mandar” nele.

E não para por aí: o casamento terá problemas, a criação dos filhos se dará com problemas também, no sentido de que esse pai tentará dar liberdade total aos filhos, o que não é também o caminho certo a seguir, porque liberdade em excesso é negligência e tido pelo filho como rejeição. É uma cadeia de problemas, um efeito em cascata.

A estrutura familiar a que o adolescente está inserido é muito importante para uma boa elaboração de sua saúde mental e, por vezes, ele vem de uma família desajustada. Então, o que ocorre é que ele fica confuso com toda essa contradição em sua vida e o sofrimento é inevitável.

Acertando os Ponteiros

Jovem rapaz em consulta ao psicanalista

Para haver o ajuste necessário nessa fase, os pais têm que vir trabalhando o seu filho desde a infância. Tornando a criança consciente de todo o processo de amadurecimento, que termina na adolescência e, em alguns casos tardios, vai até a fase adulta. É um processo longo e que se faz dia após dia.

É por isso que, se você perguntar às pessoas, cada uma vai dar uma informação diferente sobre seu filho adolescente. Cada uma tem uma opinião diferente. Porque, a cada momento, ele se mostra com uma personalidade diferente, pelo fato de sua identidade ainda não estar totalmente formada.

Está em transição e construção.

Às vezes se escuta: “ fulano tem dupla personalidade”. Nem dupla, nem tripla, nem quádrupla. A identidade está em formação e não há com o que se preocupar.

A preocupação, de um certo modo, é necessária, no sentido de ficar atento a essas mudanças, mas não se pode concluir que se trata de um caso patológico. Para ser considerado patológico, outros fatores deverão ser investigados a fim de um diagnóstico correto.

Os pais, diante de comportamentos agressivos do filho, dão mais liberdade do que o necessário, não sabendo eles que com essa atitude o adolescente se sente ainda mais abandonado. Tudo tem que ter equilíbrio na vida. E quando se trata de adolescentes, equilíbrio e bom senso são medidas obrigatórias.

Se este processo não for bem trabalhado, algumas situações e alguns problemas podem ser levados para a vida adulta e a convivência futura com a família pode ficar prejudicada.

Alguns problemas perduram para além dessa fase e, em decorrência, todos sofrem. Às vezes não sabem nem de onde se originou tudo isso.

É certo que as coisas também não são assim tão fáceis para os pais, porque perdem sua criança e agora ganham seu adolescente. Várias atitudes antes bem vividas por ambos agora têm que ser substituídas por comportamentos e manifestações de sentimentos mais adequados para aquela idade. A nova fase.

A escuta, tanto por parte dos pais, como de um psicanalista, se for o caso, é muito importante.

Uma vez perguntei a um analisando adolescente:

“Você se sente bem em estar aqui?”

Ele respondeu: “Sim”

Eu insisti: “Por quê?”

Ele disse: “Porque você me escuta”.

Às vezes o adolescente só precisa disso: alguém que o escute em seus anseios, em seus medos, em suas conquistas, em suas ideologias, em suas frustrações, enfim… um pouco de atenção sincera.

Uma das maiores dificuldades é a falta de diálogo aberto, sem críticas, sem juízos de valor. Se os pais não escutarem, nunca saberão o que está acontecendo e terão dificuldades em ajudar.

Por fim, algo muito importante é o contato físico. Claro que o contato físico nessa idade difere do contato físico da infância, mas o filho continua, e às vezes até mais, necessitando desse contato.

Palavras de amor e carinho sempre caem bem. Um “eu te amo” dos pais vale mais que mil presentes.

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por

Giorgia Matos

14/09/2017

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